A gargalhada, o convívio e a tradição perdida


    Sempre que se aproxima este tempo outonal nos meus passeios pelas ruas de Lisboa e sinto o cheiro da castanha assada, sou assaltado por memórias felizes que me deixam muito nostálgico, é muito interessante aperceber-me com o envelhecer, que essas boas memórias passam muito pela aldeia que me viu nascer e o único lugar onde tive uma infância plena, recheada, enriquecedora e onde a felicidade brotava das coisas mais simples. 

    Na minha aldeia para comemorar o magusto, as pessoas juntavam-se em redor de uma antiga casa, onde os passos de dança do rancho folclórico eram os inquilinos... Apanhava-se as fagulhas e as folhas secas dos eucaliptos e faziam-se arder pequenas fogueiras, era nessas horas longas de convívio, de gargalhadas fáceis que resultavam das brincadeiras de saltar à fogueira, de sujar as mãos nas cinzas e correr atrás uns dos outros para ver quem saía mais enfarruscado, as gerações uniam-se e não havia diferença de idade, nem para as crianças molharem os lábios na deliciosa jeropiga que acompanhava aquela castanha assada, que por mais anos que passem, nunca nenhuma terá aquele sabor, da inocência, do sonho, da felicidade e da liberdade.


    Eram serões longos, onde víamos a tarde virar noite, não dávamos pelo tempo passar, era a nossa bolha de felicidade, as crianças brincavam até se cansarem, enquanto os adultos depois da diversão entravam em longas conversas sobre tudo, os seus dias de trabalho, as suas famílias, as conquistas, as dúvidas, o passado, presente e o futuro. Vai-me ficar sempre gravado na memória os sons das risadas que eram naturais, melódicas, do cheiro... aquele cheiro que me transporta imediatamente para a minha aldeia, para a casa da minha avó, é o cheiro da lenha que arde, enquanto nos aquece e tantas vezes onde a minha avó fazia os seus cozinhados e que nenhum restaurante famoso, gourmet ou cheio de estrelas, consegue reproduzir o sabor ímpar.  

    A despedida era sempre em jeito de promessa de no ano seguinte estarmos ali todos outra vez... mas o tempo nem sempre é um bom aliado, as pessoas deixam de ter vontade de "regar a sua rosa" e vão deixando murchar, até morrer e desaparecer à face da terra... assim acabou o grupo do rancho, acabou-se a tradição do magusto, as pessoas nunca mais se juntaram, nunca mais se ouviram as gargalhadas fáceis, as longas conversas e os laços foram se perdendo.

    Sinto alguma tristeza por ver que das várias iniciativas tradicionais na minha aldeia, já só sobre uma, a do Natal, onde acendem uma fogueira que ultrapassa o tamanho da capela e vai sendo mantida acesa até ao dia de Reis... mas temo o dia em que nem essa se realizará. O que as pessoas não percebem é que perdendo as tradições, vamos perdendo a nossa identidade.  


Tiago Marques,
Mrs. Margot

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4 comentários

  1. Passei para desejar continuação de uma excelente semana!
    Beijinhos,
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  2. Como eu adorava os magustos quando era mais nova, pena que se tenha perdido essa tradição.
    Beijinhos
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  3. Gostei bastante do artigo, muito bom mesmo! Estou amando ler seus artigos e compartilhar com os amigos!


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